quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Ferramenta de trabalho.

Juiz não pode impedir advogado de ligar notebook

Juiz não pode impedir advogado de ligar notebook durante julgamentos. O entendimento do Conselho Nacional de Justiça foi firmado na análise de um pedido de providências feito por um advogado mineiro. Motivo: o juiz da 2ª Vara de Frutal (MG), Nilson de Pádua Ribeiro Júnior, mandou ele desligar o notebook da tomada, durante o julgamento, porque estava gastando eletricidade que é paga pelo Poder Público.

“Em respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, magistrado ou servidor de tribunal não pode impedir que advogado, defensor público, ou membro do Ministério Público façam uso de computador portátil em sessão de julgamento, uma vez que se encontram no exercício constitucional de suas atribuições, sob pena de configurar manifesto cerceamento de defesa”, entendeu o CNJ.

O incidente ocorreu em 28 de agosto de 2007 em um júri feito na 2ª Vara Judicial de Frutal (MG). Ali, o advogado Flávio Ribeiro da Costa ligou seu notebook a uma tomada elétrica da sala de sessões. O juiz Nilson de Pádua Ribeiro Júnior disse pra ele desligar o aparelho, sob a alegação de que o gasto decorrente do uso da energia elétrica não poderia ser suportado pelo Estado. O promotor de Justiça apoiou a solicitação do juiz.

O CNJ, antes de julgar o pedido de providências, levantou dados oficiais sobre o custo da energia para ativar o aparelho ou recarregar a bateria. Concluiu que não há nenhuma expressão econômica, conforme atestado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que informou o consumo baixíssimo (0,06 kWh) e o custo de menos de um centavo (R$ 0,038) por hora.

O Conselho Nacional de Justiça respondeu à consulta também feita pelo mesmo advogado: o notebook de uso profissional pode ser ligado à rede dos prédios dos foros e tribunais. Na decisão vem explicitado que “o episódio deve ser examinado pela Corregedoria Nacional de Justiça, à qual se remete o procedimento para análise disciplinar”.

Com informações do site Espaço VItal.

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PP 2007.1.000.013.561

Leia a decisão do CNJ

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS Nº. 2007.10.0.001356-1

RELATOR:CONSELHEIRO TÉCIO LINS E SILVA

REQUERENTE:FLÁVIO RIBEIRO DA COSTA

REQUERIDO:2ª VARA DA COMARCA DE FRUTAL – MG

ASSUNTO:CONSULTA – POSSIBILIDADE – USO DE ENERGIA – ADVOGADO – NOTEBOOK – SESSÃO DE JULGAMENTO.

ACÓRDÃO

EMENTA: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. CONSULTA DE ADVOGADO. POSSIBILIDADE DE USO DA ENERGIA DO FORUM DURANTE A SESSÃO DE JULGAMENTO. UTILIZAÇÃO DE NOTEBOOK. PRÁTICA OBSTADA POR JUIZ PRESIDENTE DA SESSÃO DO TRIBUNAL DO JÚRI. Em respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, não se pode permitir que magistrado ou servidor de tribunal impeça que advogado, defensor público, ou mesmo membro do Ministério Público façam uso de computador portátil em sessão de julgamento, uma vez que se encontram no exercício constitucional de suas atribuições, sob pena de configurar manifesto cerceamento de defesa. Além disso, o gasto de energia não tem nenhuma expressão econômica, conforme atestado pela Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, representando consumo baixíssimo (0,06 kWh) e custo de menos de um centavo (R$0,038) por hora. Episódio que deve ser examinado pela Corregedoria Nacional de Justiça a qual se remete o procedimento para análise disciplinar. Decisão unânime quanto ao mérito da consulta e, por maioria, remetido à Corregedoria.

VISTOS, etc.

ACÓRDAM os membros do Conselho Nacional de Justiça, por unanimidade de votos, conhecer e responder afirmativamente à consulta, nos termos do voto do Relator e, quanto à remessa de peças à Corregedoria para exame disciplinar, por maioria, pelo voto de desempate do Presidente.

O Senhor Conselheiro Técio Lins e Silva:

Cuida a presente hipótese de consulta formulada pelo advogado FLÁVIO RIBEIRO DA COSTA, no intuito de obter esclarecimentos sobre o embaraço havido em sessão do Tribunal do Júri da Comarca de Frutal/MG, ocasião em que foi impedido pelo Juiz Presidente, de fazer uso da energia do fórum para funcionar seu Notebook, na defesa de seu constituinte em Plenário.

Narra o Requerente que em 28 de agosto de 2007, no salão do Júri da Comarca de Frutal/MG, foi orientado pelo Presidente da Sessão do Júri a retirar da tomada o seu Notebook Compaq armada M500, com bateria que não segura carga, sob o fundamento de que a energia só poderia ser consumida pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e por seus serventuários.

Informa que, na ocasião, esclareceu ao Magistrado que toda a tese defensiva estaria em seu Notebook, assim como depoimentos, testemunhos, escaner das provas, alegações finais, contrariedade ao libelo e esquema de argumentação em Plenário, e que a utilização da energia seria no exercício da profissão e exclusivamente na defesa do réu, o que não reverteu o comando dado pelo Magistrado.

Noticia também o Requerente que, após iniciada a sessão de julgamento, tomou conhecimento de que referido fato, por ter ocorrido em momento anterior ao início da sessão, não constou em ata, e que seu requerimento de redução a termo do acontecido foi indeferido pelo Magistrado Presidente.

Terminado o julgamento e condenado o réu – seis anos e dez dias de reclusão em regime semi-aberto –, este manifestou seu desejo de não recorrer. Contudo, o óbice à utilização da energia para funcionamento do Notebook gerou grande polêmica e acalorada discussão no corredor do Fórum.

Ao final, questiona a este Conselho Nacional de Justiça “se o advogado de defesa pode utilizar da energia do Forum, para o funcionamento de seu Notebook na defesa de seu constituinte em plenário”.

No intuito de obter informações acerca do consumo médio de energia elétrica, aproximadamente, de um LAPTOP, em condições normais de uso, considerada a Comarca de Frutal/MG, oficiei à CEMIG (OFIC5) que não se dignou a prestar as informações solicitadas. Entretanto, acionada a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, sua Procuradoria-Geral, prontamente, prestou os necessários esclarecimentos (OFIC10).

Instada a se manifestar, disse a autoridade requerida em suas informações (INF19):

(i) que antes de iniciar a sessão de julgamento constatou que o peticionário tinha ligado o seu aparelho de computador portátil na energia elétrica do prédio do fórum, sem consultar o Juiz Presidente sobre a possibilidade de tal atitude;

(ii) que a situação da edificação do prédio do Fórum da Comarca de Frutal é de grave risco aos seus usuários em face da existência de infiltrações e a possibilidade de curto-circuito;

(iii) que diante da imperiosa necessidade de zelar pela vida humana e pelo patrimônio do prédio do fórum, e ainda impedir que o gasto de dinheiro público pelo uso de energia elétrica de quem não é vinculado ao serviço público, além do que o referido computador pode ser utilizado pela sua bateria e o peticionário poderia imprimir o conteúdo das suas argumentações em folhas, solicitou ao Requerente que retirasse a ligação do seu computador portátil da energia elétrica do prédio do fórum, explicando-lhe os motivos de tal solicitação;

(iv) que o peticionário concordou com o pedido sem resistência e tampouco pediu para constar este fato em ata para posterior argüição de eventual nulidade;

(v) que após transcorrido o prazo recursal, o peticionário requereu que ficasse mencionado nos autos os fatos narrados, o que foi indeferido de plano; e

(vi) que não houve a alegada discussão no corredor do fórum. Para corroborar com esta última alegação, transcreveu declarações supostamente feitas pelo Presidente da 61ª Subseção da OAB/MG (fls. 2 do INF26).

Em virtude das manifestações do MP e da OAB local, notifiquei o Requerente para que se manifestasse sobre as informações prestadas (DESP20).

Em resposta, o Requerente rebateu a versão trazida pelo Magistrado requerido, e trouxe a lume alguns fatos que, no seu entender, podem ter causado todo este constrangimento.

Noticia que alguns meses antes de ser designado para a sessão plenária em referência, representou o Magistrado requerido por excesso de prazo, por entender ser o único meio possível para impulsionar o andamento de uma ação popular, eis que, após a notificação, fora proferida decisão.

Dessa maneira, entende o Requerente que a proibição da utilização da energia do salão do júri tenha sido um ato de retaliação, uma vez que, feita consulta à secretaria do Fórum local, não se levantou nenhum precedente, ou controvérsia semelhantes a este respeito.

E relembra que a sua proposição neste Conselho se resume na seguinte pergunta: pode o Tribunal, por meio de juiz de direito, diretor do foro, negar o uso de energia do Fórum, em plenário de julgamento, ao Advogado de defesa que se utiliza de notebook, a qual não segura carga, na defesa de seu constituinte, ao argumento de que a energia só pode ser utilizada por funcionários do Tribunal e que referido fato evidencia gasto público?

Ao final, ressalta que a atitude do Magistrado, impulsionada por sugestão do Promotor de Justiça presente à sessão de julgamento, é ato atentatório ao livre exercício da profissão.

É o relatório.

VOTO

O Senhor Conselheiro Técio Lins e Silva:

É manifesta a repercussão desta consulta no âmbito do Poder Judiciário nacional, por envolver questão afeta ao exercício de função essencial à Justiça, nos termos do que previsto pelo artigo 133[1], da Constituição Federal.

Entendo que no caso ora posto em análise, o magistrado extrapolou da autonomia gerencial que lhe foi conferida como Presidente da sessão do júri e, num ato desprovido de razoabilidade e proporcionalidade, criou embaraço, dificuldade para o Requerente amplamente defender o réu, que naquela ocasião seria julgado, com provável imposição de pena a suprimir sua liberdade. O que de fato ocorreu, tendo porém o réu, após tomar conhecimento da sentença – seis anos e dez dias de reclusão em regime semi-aberto –, dela se resignado e optado por aceitá-la sem a interposição de recurso.

Dessa maneira, em resposta à consulta formulada pelo advogado requerente, em respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, não se pode permitir que magistrado ou servidor de tribunal impeça que advogado, defensor público, ou mesmo membro do Ministério Público façam uso de computador portátil em sessão de julgamento, uma vez que se encontram no exercício constitucional de suas atribuições, sob pena de configurar manifesto cerceamento de defesa.

Os argumentos de que o uso do notebook poderia causar graves riscos ao patrimônio e gastos de dinheiro públicos não tem nenhuma procedência. O consumo de energia do equipamento utilizado pelo Advogado é mínimo e o seu custo sem nenhuma expressão. Basta ver o que informou a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL.

Se utilizado o notebook pelo tempo máximo da sustentação oral da defesa – 2 horas – o consumo de energia seria de 0,12 kWh, o que é correspondente ao gasto de menos de um centavo (R$0,076), na tarifa da CEMIG, aí incluídos PIS/COFINS + ICMS, o que não pode ser considerado como “gasto de dinheiro público”, observado que o Advogado é indispensável à administração da Justiça e que no seu ministério privado presta serviço público e exerce função social, consoante estabelece o art. 2º e seu §1º do Estatuto da Advocacia e da OAB, reproduzindo norma constitucional expressa no art. 133 da CF/88.

Por todos os motivos expostos, o episódio relatado nos autos merece ser examinado pela Corregedoria Nacional de Justiça, para a qual se remete este procedimento para a devida análise.

É como voto.

Publique-se. Comunique-se e encaminhe-se à Corregedoria Nacional de Justiça cópia do procedimento, para os devidos fins. Após, arquive-se.

Sala de Sessões, 16 de dezembro de 2008.

Conselheiro TÉCIO LINS E SILVA

Relator

http://www.conjur.com.br/2009-mar-03/juiz-nao-impedir-advogado-ligar-notebook-durante-julgamento


TRECHO DE ENTREVISTA COM O ADVOGADO TÉCIO LINS E SILVA


Jornal dos Advogados – E hoje, dr. Técio?

TLS – Hoje, o advogado, muitas vezes não é tratado com dignidade. É maltratado! Hoje, nos processos de criminalidade econômica, os advogados, por vezes, são tratados como marginais, coisa que não ocorria nem nos tempos da ditadura, no auge dela. Hoje, os advogados que defendem acusados dos chamados crimes hediondos passam por grande dificuldade de serem reconhecidos como profissionais. Existe uma deformação perigosa no pensamento, na prática desses operadores do Direito que lidam do outro lado advocacia, em relação à atividade que o advogado exerce. Hoje, sinto-me afrontado, desrespeitado como profissional, o que não sentia quando tinha 22 anos, quando enfrentava o poder armado; ia para a audiência com um soldado com o dedo no gatilho atrás da gente. Naquele tempo, os réus, que eram tidos como inimigos da pátria, subversivos perigosos, não ficavam algemados na sala de audiência, porque nós não deixávamos que eles permanecessem sob algema e os militares mandavam retirar a algema deles.


Jornal dos Advogados – O que o senhor sente com essa demonização por parte da mídia dos advogados, principalmente os criminalistas, com suas prerrogativas absolutamente ignoradas?

TLS – Sinto principalmente temor, porque não me sinto protegido, como me sentia naquele tempo. Como a Ordem naquele tempo que era muito mais conservadora, do ponto de vista da compreensão política...


Jornal dos Advogados – A OAB não está cumprindo com o seu papel?

TLS – Acho que ela não está atenta para essa demonização da advocacia, para esse desrespeito. Ela não está reagindo de forma adequada, permitindo a criação de uma cultura de que o advogado é sinônimo de bandido, de que o advogado se iguala ao cliente. Coisa que nunca existiu. Um exemplo para compararmos o que era a OAB e o que é hoje: meu pai foi intimado uma vez para depor num IPM e ele pegou a intimação e encaminhou ao presidente da Ordem do Rio de Janeiro, que era o Luiz Mendes de Morais Neto, um militante da extrema direita, que havia participado do movimento de Aragarças e Jacareacanga. O presidente da Ordem, mesmo sendo a favor da ditadura, foi no lugar dele e disse que meu pai não iria depor e não foi mesmo!


Jornal dos Advogados – Temos assistido, principalmente pela mídia televisiva, determinados episódios que vão ate a gravação de conversas do advogado com seus clientes, com o intuito claro de querer mostrar para a população práticas incorretas dos advogados, tipo “manda o cliente mentir” etc. Como é que o senhor vê isto? Até onde vai o amplo direito de defesa e como é o exercício profissional nesses casos?

TLS – Acho que responsabilidade da direção da Ordem é gigantesca no sentido de esclarecer a opinião pública em relação a estes episódios. Sobretudo por que são episódios em que o advogado não aparece bem...


Jornal dos Advogados – A OAB inclusive tem criticado os profissionais...

TLS – É um absoluto equivoco. É preciso mais do que nunca que a instituição saia em defesa do exercício da profissão. Que esclareça o que significa isto para a cidadania, que o advogado estava no exercício do segredo da relação, garantido por lei, e que ninguém pode violar. E ela foi violada! Mas o advogado disse coisas que não são bonitas, que podem ser censuráveis. Muito bem, mas aí se confundem aquele mau conselho, aquela conversa com o exercício da profissão e ninguém diz “alto lá”. Em primeiro lugar, é uma ilegalidade porque ninguém poderia ter ouvido essa conversa, então essa prova é ilícita. Em segundo lugar, isso faz parte de um direito. Então se o advogado diz coisas bonitas ou não isso não é problema nosso. Outro episódio também famoso em que um dos advogados orienta a cliente a se portar de uma certa maneira perante o público etc. Outra vez, vieram todos a criticar. Felizmente, neste caso, o Tribunal de Ética de São Paulo mandou arquivar. O presidente da OAB de São Paulo, por exemplo, tem sido muito ativo, presente na defesa das prerrogativas. Mais do que defender as prerrogativas é preciso orientar, educar, esclarecer a opinião pública e não deixar que a mídia massacre, confunda isso. Porque o direito de defesa é uma conquista da civilização, da humanidade e vem de Cristo. Não é à toa que os tribunais tem a cruz de Cristo nas salas de julgamento. Não é porque eles são católicos – às vezes juízes que praticam outras religiões já requereram a retirada daquele símbolo nas salas – mas sim porque aquilo é uma lembrança da injustiça e da falta de defesa. É para lembrar o quanto é sagrado o direito de defesa. E esse direito tem que ser protegido pela Ordem dos Advogados do Brasil. E se não o for, a Ordem não cumpre o seu papel fundamental, que é o da proteção da profissão neste aspecto que é o mais difícil, o mais extraordinário que a profissão tem. A defesa da advocacia criminal é fundamental para o exercício da cidadania e esta responsabilidade cabe à OAB.


Jornal dos Advogados – Qual é sua avaliação sobre o papel do Sindicato dos Advogados?

TLS – O sindicato presta um serviço importantíssimo para o exercício da advocacia. Ele é um auxiliar poderoso nas questões da advocacia, na defesa das prerrogativas e na de todos os outros direitos.